sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

"BOLÃO: GANHA MAS NÃO LEVA!

"BOLÃO": ganha mas não leva!

Um grupo de apostadores na modalidade de loteria “mega-sena” que participaram de um “bolão” – espécie de um “consórcio entre amigos” --- acertou as seis dezenas há alguns dias atrás, e teria faturado mais de 50 milhões de reais. Isto não ocorreu, contudo, porque uma funcionária da lotérica que patrocinou o “bolão” não teria efetivado o jogo. Ou seja, não teria repassado o conjunto de jogos para o sistema informático da Caixa Econômica Federal na cidade gaúcha de Novo Hamburgo. Quem, em última análise, é responsável pelo prejuízo sofrido pelos frustrados apostadores? Para respondermos a essa indagação é mister, primeiramente, analisarmos a natureza jurídica do sistema de loterias no país. E, com efeito, esse sistema, como se sabe, é um serviço público e monopólio da União que, no caso da “mega-sena” e outros jogos, é exercido pela Caixa Econômica Federal, como prestadora de serviço público delegado. E, para que os jogos se viabilizem, são feitos contratos de permissão entre o referido estabelecimento de crédito público e os agentes lotéricos, pessoas físicas ou jurídicas. E pelo que se pode verificar dos atos administrativos que disciplinam referidos contratos de permissão, notadamente o mais recente, a Circular CEF Nº 471/2009, eles estabelecem uma série de obrigações e proibições referentes aos agentes lotéricos, dentre as quais se destaca a de não vender, intermediar, distribuir e divulgar qualquer outra modalidade de sorteio ou loteria, ou quaisquer jogos de azar, ainda que legalmente permitidos, salvo com autorização por escrito da CAIXA (item 23.4.2). Para o caso de descumprimento dessa vedação, a mesma circular prevê sanções, que podem chegar até a cassação da permissão concedida para operar (Anexo II da Circular 471/2009, Grupo 1 de infrações, itens 5, 17 e 18). No caso da elaboração de “bolões”, portanto, embora não prevista de forma expressa, fica evidente que se cuida de intermediação manifestamente proibida, e que sujeita o infrator a sanções. Mas e quem sofreu prejuízo com a omissão na elaboração efetiva da aposta? O Código de Defesa do Consumidor, em se tratando de serviço público --- que é o caso da atividade lotérica, como já assinalado --- estabelece em seu art. 22 e parágrafo único que os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. E, nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código. Em princípio, e pela lógica, a lotérica, pessoa física ou jurídica, é que deveria responder perante os lesados pela indenização cabível. Todavia, ainda de acordo com o Código do Consumidor, tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo (parágrafo único do art. 7º). Desta forma, os interessados poderão acionar tanto a lotérica como a Caixa Econômica Federal, em conjunto, e solidariamente. Aquela pela responsabilidade direta, ou seja, por haver incorrido em conduta vedada, tornando o serviço oferecido inadequado,ineficiente, e, sobretudo, inseguro; esta última, por ser a permitente do serviço público e que igualmente teria falhado no seu dever de fiscalizar a atividade permitida contratualmente, deixando de constatar e coibir a conduta proibida. Quando assim não fosse, porém, essa responsabilização é “objetiva”, ou seja, independentemente de culpa, conforme estatuído pelo art. 14 ainda do Código do Consumidor. Aliás, essa obrigação está prevista de forma expressa na própria Constituição Federal de 1988, mais particularmente no § 6º do art. 37. Ou seja: independentemente se o fato ocorreu por negligência ou até dolo, eventualmente, da funcionária ou do próprio dono da lotérica, isto pouco importa. O que importa é que houve o fato e o prejuízo, bastando que os interessados demonstrem o nexo causal entre esse fato e o dano que provocou. A prova material é, simplesmente, o volante “oficioso” fornecido pela lotérica, e a demonstração de que o jogo vencedor teria sido feito, mas não o foi.

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