quarta-feira, 19 de novembro de 2008

ANISTIA DEFINITIVA? EPPURE SI MUOVE!

Foram os seguintes os comentários feitos por mim acerca de crônica elaborada pelo jornalista Clóvis Rossi, da Folha de S. Paulo, e sua resposta:
Caro José Geraldo, grato pelos ponderados comentários, mas a grande maioria dos terroristas (e há que distingui-los dos que apenas se opuseram ao regime sem praticar atos terroristas) foi sim punida, inclusive com execuções sumárias, fora banimento (para os que foram trocados em seqüestros), o que é punição e cruel. Abs. Rossi.

De: José Geraldo Brito Filomeno [mailto:filomeno@uol.com.br] Enviada em: segunda-feira, 17 de novembro de 2008 14:38Para: crossi@uol.com.brAssunto: As Feridas Imprescritíveis

Prezado Sr. ROSSI:


Se puder e tiver tempo de ler, ante as sem dúvida centenas de e-mails que recebe, permita-se concordar mas, ao mesmo tempo, discordar, de sua coluna "As Feridas Imprescritíveis" (Folha, 16-11-08). Concordo que, realmente, se tiver de haver reabertura dos casos terríveis ocorridos durante o regime de exceção (1964-1985), dever-se-ão punir tanto os que praticaram terrorismo de Estado, mediante procedimentos de tortura e mortes, como os que exercitaram terrorismo ou atentados na luta armada. Discordo quanto ao fato de que, enquanto que os do segundo grupo foram punidos, o mesmo não ocorreu com os do segundo. Quantos não foram os "prisioneiros políticos" que praticaram roubos a bancos, seqüestros de dignatários e outros atos, de homicídios, inclusive, e foram trocados pela libertação de seqüestrados e, por conseguinte, não foram efetivamente punidos, efetivamente, no que toca à imposição de pena criminal propriamente dita? Por outro lado, embora sejam imprescritíveis os delitos de tortura e de terrorismo (art. 5º, inc. XLIII da Constituição Federal), bem como tenha havido o repúdio ao segundo, juntamente com o racismo (art. 4º, inc. VIII da mesma C.F.), ESSES CRIMES ATÉ 1988 NÃO ERAM SEQUER TIPIFICADOS. E, por conseguinte, os crimes praticados, tanto pelos servidores-terroristas do Estado de exceção, como pelos "revolucionários-terroristas", eram crimes como "seqüestro ou cárcere privado", maus tratos, constrangimento ilegal, roubos, latrocínios, homicídios simples ou qualificados, lesões corporais leves, graves ou gravíssimas etc., TODOS, SEM EXCEÇÃO, COBERTOS PELA PRESCRIÇÃO ORDINÁRIA DO CÓDIGO PENAL E DO CÓDIGO PENAL MILITAR, QUE É DE 20 ANOS. Até porque, NÃO ERAM FATOS TÍPICOS, DO PONTO DE VISTA CRIMINAL. Evidente que não concordo com qualquer um dos tipos em questão, até porque exerci as funções de Ministério Público por 30 anos, e jamais pactuei com qualquer ato de violência, mas antes, os denunciei sempre em autos que me foram encaminhads. Atenciosamente, JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO (assinante da Folha, fone 3078-2777).
EPPURE SI MUOVE! A polêmica, porém, está longe de terminar. Na Folha de S. Paulo, de hoje, a doutora em direito pela Universidade Paris 1 e professora de direito internacional do Instituto de Relações Internacionais da USP, DEISY VENTURA, volta à carga, ao dizer que, em suma, que "urge repelir a idéia de que a anistia ´vale para os dois lados´; primeiro, pelo descalabro técnico; depois, pela infâmia política". Diz, ainda, que "é preciso também refutar o enganoso argumento da prescrição; farta e unânime jurisprudência internacional, inclusive da Corte Interamericana de Direitos Humanos, cuja jurisdição é aceita pelo Brasil, sustenta a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade; não se trata de imposição, eis que o direito internacional consiste justamente no exercício da soberania nacional em foro externo; construído pelo consenso entre as nações, aplicá-lo é tarefa constitucional de cada Estado". Com o devido respeito, e sem embargo de se cuidar de doutora em direito por instituição estrangeira, parece que se esqueceu, ou não examinou detidamente, dois pilares fundamentais da legislação de caráter penal, aprendidas ainda no primeiro ano dos cursos de graduação em direito, mesmo em face do direito internacional, além da própria netureza jurídica do instituto da anistia. Ou seja: a) o princípio da estrita legalidade e anterioridade da legislação penal (nullem crimen nulla poena sine lege); e b) o da prescrição. Se não, vejamos. Conforme o princípio CONSTITUCIONAL TRADICIONAL DO DIREITO BRASILEIRO, NÃO HÁ CRIME SEM QUE LEI PREVIAMENTE O DEFINA COMO TAL, E, CONSEÜENTEMENTE, TAMPOUCO PODE HAVER PENA SEM PRÉVIA COMINAÇÃO LEGAL (cf. inciso XXXIX do art. 5º da Constituição de 1988). Ora, conforme já havíamos salientado acima, durante o regime de exceção, ou ditatorial, como se queira denominá-lo, não havia previsão nem de crime de tortura, nem de crime de terrorismo, quer de natureza revolucionária, quer de Estado (cf. nosso "Manual de Teoria Geral do Estado e Ciência Política", Ed. Forense Universitária, RJ, 6ª edição, pág. 270 e seguintes). Portanto, cuida-se, na espécie, de fatos atípicos, ao menos com essa configuração. Resta outrossim evidenciado que houve, sim, fatos então típicos, como crimes, tanto de um lado como de outro, tais como: roubos, latrocínios, homicídios qualificados, atentados por explosões, maus tratos, constrangimentos ilegais, cárcere privado ("seqüestros") etc. Quanto a esses todos, entretanto, conquanto graves, OPEROU-SE A PRESCRIÇÃO, INCLUSIVE NO QUE TOCA AOS HOMICÍDIOS QUALIFICADOS, CUJO PRAZO PARA TANTO É DE 20 ANOS. Desta forma, ainda que o Brasil seja signatário de tratados internacionais, a verdade é que nenhum fato ocorrido durante o referido regime, era tipificado como terrorismo ou tortura, que, a partir de 1988, então, sim, passaram a ser considerados figuras típicas e imprescritíveis. Quanto a isso, não se tem a menor dúvida. Por outro lado, ANISTIA, conforme o Novo Dicionário da Língua Portuguesa para o Século XXI de Aurélio Buarque de Holanda (Ed. Nova Fronteira), deriva do latim AMNESTIA, ou seja, ESQUECIMENTO, PERDÃO GERAL, ATO JURÍDICO PELO QUAL O PODER PÚBLICO DECLARA IMPUNÍVEIS, POR MOTIVO DE UTILIDADE SOCIAL TODOS QUANTOS, ATÉ CERTO DIA, PERPETRARAM DETERMINADOS DELITOS, EM GERAL POLÍTICOS, SEJA, FAZENDO CESSAR AS DILIGÊNCIAS PERSECUTÓRIAS, SEJA TORNANDO NULAS E DE NENHUM EFEITO AS CONDENAÇÕES. Desta forma, é, sim, puro revanchismo ou proselitismo político e ideológico de alguns setores que se dizem ou reconhecidos como de esquerda ou progressitas, ou, ainda, revisionistas, pretenderem rever os fatos, conquanto horríveis, esquecidos pela grande maioria do povo brasileiro.

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